Está cada vez mais difícil consumir no Brasil. Apesar de não ser uma realidade exclusiva do país, pois as principais economia do mundo sofrem com os efeitos da pandemia, aqui o cenário se agrava pelo câmbio desvalorizado, bem como pela insegurança fiscal.

Estas particularidades fazem com que o Brasil esteja em 3º lugar no ranking entre as maiores inflações do mundo. O fato não atinge apenas os mais pobres, que sofrem mais com os efeitos dos preços altos. Toda a cadeira produtiva sentiu o impacto, seja no preço da gasolina, na conta de luz, no supermercado, ou na compra de insumos.

Antes, a inflação era concentrada na alta dos preços dos alimentos. Entretanto, agora ela se generalizou pela economia do Brasil.

Ranking da inflação

Ao comparar a inflação nas principais economias do mundo, o Brasil aparece logo atrás da Argentina, país este que vive uma das piores crises inflacionárias da sua história, e do Haiti, um país que históricamente passa por problemas econômico-financeiros e um dos que mais sofreram com o câmbio na pandemia.

De acordo com o Ibre/FGV, a alta acumulada em 12 meses até julho, forma o segunte ranking:

País Alta da inflação acumulada em 12 meses
Argentina 51,8%
Haiti 17,9%
Brasil 9%
República Dominicana 7,9%
Uruguai 7,3%
México 5,8%
Chile 4,5%
Honduras 4,3%
Nicarágua 4,1%
Colômbia 4%
Guatemala 3,8%
El Salvador 3,4%
Peru 2,7%
Panamá 2,4%
Costa Rica 1,4%
Paraguai 1,2%
Equador 0,5%
Bolívia 0,2%

Fonte: Ibre/FGV

Vilões do Brasil: combustível e energia elétrica

Em suma, os principais responsáveis pela alta da inflação no Brasil, são a energia elétrica, a qual ganhou uma tarifa extra na conta por conta da crise hídrica, e os combustíveis. Enquanto a energia elétrica acumula uma alta de 25% no ano, a gasolina acumula elevação de mais de 70%.

Em suma, o custo da energia e do combustível afeta toda a cadeia produtiva, e assim atinge diretamente o consumidor final. Enquanto um cabeleireiro pode aumentar o preço do corte para compensar a conta de luz mais cara, o combustível alto pode encarecer todos os alimentos no supermercado.

De acordo com o professor de economia do Insper, Roberto Dumas, "O choque de oferta causado pela pandemia de Covid-19 atingiu o mundo inteiro, mas o Brasil ainda teve a forte desvalorização da sua moeda, um componente a mais para que a inflação acelerasse".

Conforme o professor, o cenário não é dos melhores. "Em um contexto de aumento do risco fiscal, os investidores tendem a retirar seu capital do país e o dólar deve subir ainda mais ante o real".

Além disso, André Braz, economista da FGV IBRE, afirma que a desvalorização do câmbio não é o resultado apenas das incertezas fiscais por conta da falta de clareza no orçamento de 2022. O cenário vem sendo desenhado desde 2020, com as primeiras políticas sanitárias de combate a pandemia.

"O governo federal adotou uma postura com o surgimento da Covid, como a recomendação do uso de cloroquina, de não estimular o uso de máscaras e do distanciamento social, o que gera uma incerteza doméstica muito grande. Esse discurso segue até hoje e difere dos que os governadores e prefeitos têm feito, o que contribui para a manutenção deste cenário de dúvidas", explica o economista.

Aumento da taxa Selic

Na busca por tentar frear o aumento dos preços, o Banco Central eleva a Selic em um ciclo contínuo de aperto monetário que iniciou em 2020, quando a taxa básica havia atingido a sua mínima histórica de 2% ao ano. Agora, o mercado já vê a Selic chegando nos dois dígitos em 2022.

Elevar a taxa básica de juros é a principal ferramenta da autoridade monetária para controlar os preços. A estratégia, entretanto, opera melhor em uma economia aquecida, na qual o encarecimento do crédito deixa os consumidores mais contidos.

O cenário atual de preços pressionados, entretanto, vem menos da atividade aquecida e mais de fatores que não podem ser facilmente controlados artificialmente. Ou seja, ninguém vai escolher por deixar de consumir energia elétrica só porque está mais caro. A lógica é a mesma para alimentação.

Dessa forma, o poder de bala do Banco Central é ineficaz. Além disso, Roberto Dumas afirma que a política monetária demora em torno de 6 a 7 meses para surtir efeito. Por conta disso, o tempo é fundamental para que os juros sensibilizem a inflação.